Uma conversa saborosa com quem aprecia as boas coisas do pecado da gula. Jornalista esportivo e chegado às coisas do fogão.
terça-feira, 16 de fevereiro de 2010
Carnaval à moda japonesa
Balcão de sushibar é sempre uma grande aventura. Recordei-me da Ruth Reichl em seu livro "Alhos e safiras", descrevendo a experiência que teve no Karumazushi, em Nova York, saboreando iguarias que jamais imaginaria pode experimentar. Claro que por aqui é diferente. Curitiba está muito longe de ser um polo da comida japonesa até mesmo na comparação direta com São Paulo, aqui não tão longe. As opções que o bairro da Liberdade oferece são inúmeras e por lá também se encontra de tudo.
Mas Curitiba também pode te causar algumas surpresas agradáveis na explosão de sabores novos em um balcão de sushibar. Não em qualquer uma das tantas casas japonesas que invadem a cidade a todo instante, fazendo do previsível rodízio (ah os rodízios, que mal fazem à sensibilidade gastronômica!) o chamariz para pessoas que gostam de comer muito, quanto mais melhor. E dá-lhe combinados, muito shoyu, muito wasabi. Difícil o lugar onde se encontra o sabor pelo sabor, valorizando cada porção pelo que ela traz de bom. No restaurante Kan, por exemplo. Não de graça insistentemente premiado pelas revistas especializadas nesses poucos anos de existência (aberto em agosto de 2007), herdou a ótima estrutura gastronômica do Takô, a partir de Marcos Katsumi, responsável pela casa e, principalmente, pelo sushiman Luciano Mitiharu Kawano, capaz de criar na hora pratos que o cliente jamais esperaria.
A vantagem de se acomodar defronte a um balcão desses é que nunca se sabe o que virá à mesa. Menu confiança – absoluta confiança. E por isso não é em qualquer casa que se pode arriscar assim. Bem, algumas dessas bem comerciais sequer têm o tal balcão. Mas no Kan é tiro certo. Como foi possível comprovar na noite da segunda-feira de carnaval, longe da TV ligada com aquele esquidum das escolas de samba. Não sem antes escolher a bebida para acompanhar. Saquê, é claro. Ozeki, um bom japonês a preço razoável – lá tem aquele com pedacinhos de ouro, acho que a R$ 150 a garrafa. Mas não era o caso.
- Estamos em suas mãos – e o desafio foi lançado ao sushiman (e no fundo do fundo é tudo o que ele deseja que aconteça).
Veio uma entradinha básica do restaurante, aquela que vai a todas as mesas. Otoshis, pedacinhos de salmão levemente tostados e servido com molho branco cremoso chegaram sobre cestinhas de massa crocante.
Em seguida, começou o desfile de atrações de Kawano, os Okonomi (duplas de sushis). Primeiro, Nametake, micro-cogumelos japoneses (variedade do enoki) em conserva de molho de ostra, servidos dentro de conchinhas de limão, do qual adquirem o toque de sabor no momento de degustar. Por serem miudos demais, vieram acompanhados de uma colherinha. Mas nem precisava.
O segundo prato já mais convencional, embora não menos interessante. Tiras de atum cruas por dentro e tostadas por fora, servidas com ovas de caranguejo e molho de missô.
Em seguida a pura expressão do sabor pelo sabor: Sushi de vieiras. E não qualquer vieira, mas aquelas canadenses, as scallops, vieiras canadenses, algumas com diâmetro até de 12 cm. Um corte delicado da carne do molusco sobre a base de arroz, uma tirinha retorcida de limão em cima e azeite de oliva para completar. Precisa mais?
As enguias (unaguis) que vieram depois estavam soberbas, escoltadas por molho tarê. Fatias firmes, de ressaltar o sabor ao se mastigar.
Aí chegou uma dupla incrível: polvo e água-viva. Não um polvo qualquer, daqueles fatiados que existem em qualquer lugar e sim polvos minúsculos, vermelhos, que cabem inteiros em um sushi – os minitakôs. Já conhecia, não era novidade, mas o sabor diferenciado sempre me ganha. A água-viva é mais cartilaginosa, mas também traz à boca delicadas e apreciáveis referências, marcando pela presença de delicadas flores de sisho (a mesma daquela folha muito utilizada na cozinha japonesa e que dão uma leve dormência na língua ao serem digeridas).
O prato seguinte foi um fracasso. Não do sushiman, sempre impecável, mas do blogueiro, que se empolgou de tal forma com a sequência que primeiro comeu e depois se lembrou da proposta de fotografar. Era um trio, com atum rosemberg, com molho de wasabi, maionese e shoyu; robalo, com folhas de sisho na parte interna e ovas de salmão por cima; e tiras de barriga de salmão (quase como se fosse o toro para o atum). Quando me dei conta só tinha sobrado o atum e mesmo assim a foto ficou ruim. Que vexame!
Mas me reabilitei em seguida, aguardando pacientemente para escolher o melhor ângulo para os cubos de salmão com molho de maracujá, o fecho da bela noite de paladar apurado. A colherinha voltou, desta vez de forma compreensível, para poder levar o delicado molho da fruta à boca.
Poderia haver mais, muito mais, acredito, se tivéssemos instigado e insistindo com a criatividade de Luciano Kawano (muito bem assessorado por Juliano e Marcos Antônio). Mas já era suficiente, garantindo o prazer em uma bela noite de carnaval, sem cuícas nem tamborins.
Restaurante Kan
Avenida Getúlio Vargas, 3.121 - Água Verde (Curitiba)
Fone: (41) 3078-8000.
Site:
www.restaurantekan.com
Assinar:
Postar comentários (Atom)
Nenhum comentário:
Postar um comentário