
Sou
fissurado por novos sabores. Jamais me acomodo em repetir sempre os
mesmos pratos, por mais gostosos que estejam. Sempre há algo de novo a
ser descoberto, seja uma técnica, seja uma alquimia, seja um
ingrediente.
Macis, por exemplo. Já ouviu falar? Pois eu sim, mas fazia muito
tempo. A referência vinha de uns fascículos antigos, anos 80, que hoje
permanecem devidamente encadernados em uma estante apenas com livros e
revistas gastronômicas. Tanto assim que nem me lembrava mais.
Mas de uns tempos para cá tenho me dedicado a pesquisar essas
publicações, pois na época ainda estava muito inseguro na cozinha e
qualquer dificuldade que a receita apresentasse já passava para a
próxima. Hoje, um pouquinho mais calejado, tenho redescoberto e
executado verdadeiras preciosidades, principalmente da cozinha
tradicional de vários países.
Blanquette de veau é um deles.
Blanquette vem de
blanc, branco em francês.
Veau
é vitelo e a tradução poderia ser Vitelo em molho branco. É um dos
pratos mais famosos da culinária francesa (eles também utilizam a
técnica para frango, cordeiro ou coelho). Os cubos de carne bem cozidos
são servidos com um molho aveludado, engrossado com uma mistura perfeita
de gemas e creme de leite, conhecida como
liaison (liga). O sabor suave da carne é realçado com uma escolha bem equilibrada de diversos temperos, ervas aromáticas e especiarias.
E é aí que entra o macis. É uma especiaria obtida da casca que
envolve a semente da noz-moscada, de cor vermelho-vivo, que fica
castanho quando seca. Inteiras são usadas para realçar o sabor de sopas e
cozidos. Moída pode ser incluída em pratos doces, como pudins, bolos e
bebidas. Também combina com suflês, salsichas, embutidos, molhos
cremosos e diversos tipos de carne, inclusive peixes e de caça. Na
Itália, rala-se em cima de massas recheadas.
A questão era saber se seria encontrada por aqui. Mas no Mercado
Municipal de Curitiba nada é impossível e encontrei, sim, no Empório
Francisca, que tem toda a linha da Bombay. É caro, bem mais caro que a
noz-moscada. E também mais forte, devendo ser usado com parcimônia.
Macis garantido, nada mais impedia que finalmente pudesse ser
executada a receita da Blanquette de veau tradicional. Foi só adquirir
os ingredientes e combinar algumas receitas com aquela escolhida. Sim,
porque só depois reparei não estarem incluídos os cogumelos e as
cebolinhas que sempre me pareceram marca de identidade do tal prato. Uma
rápida pesquisa em alguns bons sites franceses e sugestões da
Blanquette à l’ancienne (as mais tradicionais e antigas) surgiram para resultarem em uma receita final a ser posta em prática.
Seria o almoço de domingo. O prato principal. Encontrar a entrada e a
sobremesa não foi difícil. De entrada, uma receita da mesma publicação,
interessante combinação de espinafre cru (pouca gente consome se não
for cozido), ricota, iogurte e carne de siri. Como tudo que tem a ver
com espinafre é “à florentina” (sabe que não sei por quê?), o nome
oficial do prato é
Florentinos de siri. Uma entrada leve, que, pelo frescor, se dá até melhor no verão.
A sobremesa, sim, tem a ver com esses dias de inverno que vivemos. Já
tínhamos feito o teste dias atrás e agora, aprovada, foi pra valer.
Caqui caramelizado ou
Brûlée de caqui
– como queira. Cortada em metades, a fruta vai ao forno (grill forte)
com uma camada de açúcar demerara até que doure. Dei um toque final com
maçarico pra conseguir aquela crocância do tradicional creme queimado
francês. Ficou delicioso, ainda mais acompanhado pela suavidade do creme
com mel e toques de laranja.
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